Especialistas criticam decreto de crédito de carbono no Brasil

Um decreto federal para criar um mercado de crédito de carbono no Brasil é vazio em conteúdo e não gerará impactos de curto prazo no setor de energia, disseram especialistas locais à BNamericas.

Publicado em 19 de maio, o decreto trata de planos de mitigação das mudanças climáticas e cria o sistema nacional de redução de emissões de gases de efeito estufa.

O regulamento estabelece os conceitos de crédito de carbono e metano, unidades de estoque de carbono e registro de emissões, reduções de emissões e transações de crédito.

Também envolve a possibilidade de registrar a pegada de carbono de produtos, processos e atividades, carbono da vegetação nativa e do solo, contemplando produtores rurais e mais de 280 milhões de hectares de floresta nativa protegida, além de carbono azul contido em áreas marinhas, costeiras e fluviais, incluindo manguezais.

Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima, disse que o decreto é mais um documento vazio criado apenas para reforçar as declarações das autoridades.

“O texto não esclarece como funciona o mercado, nem como serão calculadas as metas setoriais para atingir a meta global brasileira – que, aliás, ainda inclui quebra de acordos climáticos e confrontos com o Acordo de Paris”, disse ela à BNamericas.

Araújo disse que as taxas de desmatamento dispararam, os incentivos para combustíveis fósseis aumentaram e a supervisão ambiental federal implodiu, enquanto gangues apoiadas pelo governo dominam a Amazônia.

“Dado isso, quão confiável será esse mercado de crédito de carbono? Quando se trata de instrumentos de mercado, o elemento confiança é fundamental”, disse ela, destacando que o Brasil está no caminho para aumentar as emissões.

“Então, o que o país pretende oferecer atualmente nessa área? O decreto não vai funcionar”, disse Araújo.

André Luis Ferreira, diretor do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), disse que o decreto não terá efeitos por enquanto, pois apenas explicitou algumas diretrizes gerais que ainda precisam ser regulamentadas. “O decreto cria um sistema nacional de redução de emissões de gases de efeito estufa, mas ainda não está claro como isso vai funcionar”, disse ele à BNamericas.

“Não vejo, neste momento, impactos relevantes no setor de energia. Teremos que esperar pelos próximos passos.”

Em nota, o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, disse que o mercado de crédito de carbono vai amadurecer após a aprovação de um projeto de lei federal, que é debatido pela opinião pública e no Congresso e tem apoio do governo.

De acordo com os dados mais recentes do Iema, as emissões de gases de efeito estufa do setor de energia do Brasil totalizaram 394 MMt de CO₂ equivalente emitido no ano passado, queda de 4,6% em relação a 2019 e o menor valor observado para o setor desde 2011.

Restrições de mobilidade social e quarentenas durante a pandemia foram as principais causas da queda.

No entanto, as emissões nacionais aumentaram 9,5% em 2020, totalizando 2,16 Bt versus 1,97 Bt em 2019, principalmente devido ao desmatamento, em especial nos biomas da Amazônia e do Cerrado.

Tanto o Iema quanto o Observatório do Clima planejam publicar dados atualizados em breve.

Dada a maior utilização de energia termelétrica em meio à seca em 2021, é provável que as emissões tenham aumentado significativamente em relação a 2020.