
‘Vivemos o paradoxo de ter um mercado livre com preços baixos, mas uma conta alta para os consumidores’

Subsídios, regulamentação mal feita e interesses políticos são empecilhos para o Brasil reduzir suas tarifas de energia e atrair indústrias globais interessadas em produzir a partir de fontes renováveis.
A opinião é de Paulo Pedrosa (foto), presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres (Abrace), que reúne mais de 50 grupos empresariais responsáveis por quase 40% do consumo de energia elétrica e 42% do consumo de gás natural do país.
Nesta entrevista, Pedrosa e os diretores de gás e energia elétrica da Abrace, Adrianno Lorenzon e Victor Locca, respectivamente, abordam os principais desafios e perspectivas para o setor.
BNamericas: O Brasil é um dos países com as tarifas de energia elétrica mais caras do mundo. Que estratégias os grandes consumidores de energia têm adotado para reduzir seus custos?
Pedrosa: Do ponto de vista conjuntural, como as tarifas de energia elétrica na Europa estão muito impactadas pela guerra na Ucrânia, e isso contamina outros países, neste momento não somos mais os campeões da energia mais cara. Mas poderíamos ter uma energia muito mais limpa, barata e segura.
A riqueza energética do Brasil é capturada por interesses da cadeia da energia, através de subsídios, proteções, regulações mal feitas e falta de competição, além de interesses políticos que “se penduram” no setor de energia.
Enquanto isso, no setor de gás natural, vemos um movimento de concentração do mercado de gás, o que não favorece a concorrência.
Acho que o ministro [da Fazenda, Fernando] Haddad capturou, em sua participação no Fórum Econômico [Mundial] em Davos, uma oportunidade gigante para o Brasil: de que podemos ser um hub de energia renovável, atraindo indústrias que estão pressionadas por energia cara em outros lugares do mundo para produzir aqui.
BNamericas: Você fala em concentração no mercado de gás, apesar do trabalho feito pelo governo e pelas autoridades para abrir esse setor, com um novo arcabouço regulatório, reduzindo a participação da Petrobras e atraindo novos fornecedores do combustível.
Pedrosa: Acontece que, na prática, os anticorpos contra a modernização prevista pela Nova Lei do Gás têm vencido em muitas situações. E a regulação do gás é antiquada e favorece as distribuidoras nos estados.
Lorenzon: Tivemos uma certa diversificação na oferta da molécula, com 10% a 15% do gás vendido saindo das mãos da Petrobras e indo para players privados. Mas há uma tendência de concentração da demanda, primeiro porque a Petrobras vendeu a Gaspetro para a Compass [do grupo Cosan], que já era dona da principal distribuidora [Comgás], e o mercado livre ainda é muito pequeno. E, do lado da oferta, também enxergamos uma tendência de concentração na Petrobras. Esses 10% a 15% talvez sejam um teto, tendo em vista o pipeline de projetos da Petrobras que entrarão em operação nos próximos anos.
BNamericas: Tem a questão do gasoduto Subida da Serra, sobre a qual a Abrace já se posicionou.
Lorenzon: O projeto Subida da Serra é um exemplo de self-dealing que a Compass vem praticando, como a Petrobras fez ao longo de sua história.
Vale ressaltar que a Cosan comprou a Sulgás, deve comprar a ESGás e pode adquirir participação na distribuidora paranaense [Compagás, que será privatizada]. Há também a Gasmig, que deve lançar um IPO.
BNamericas: Não cabe ao Cade agir para evitar essa concentração?
Lorenzon: O Cade não vetou a compra da Gaspetro pela Compass. Nós fomos bastante vocais contra essa venda, que contrariou o próprio TCC [termo de compromisso de cessação] assinado pela Petrobras com o Cade [em 2019 para reduzir a concentração do mercado na estatal]. Não dá para confiar que ele agirá agora.
BNamericas: A hidrologia no país passa por um momento especialmente favorável, bem diferente do que se viu em 2021. A expectativa é de tarifas de energia mais baixas este ano?
Pedrosa: Nossa base é o consumidor industrial, que está no mercado livre. Então nós enxergamos não a tarifa, mas o custo final da energia, que embute um conjunto de encargos que são pagos pelo consumidor. Percebemos que, neste momento, os preços dos contratos de energia estão baixos, mas as perspectivas futuras seguem preocupantes.
Os custos de transmissão estão crescendo, e os custos pagos por todos os consumidores pela reserva de capacidade de energia devem se elevar. Vivemos, no Brasil, o paradoxo de ter um mercado livre com preços baixos, mas uma conta alta para os consumidores. Nossa prioridade é a modernização do setor elétrico e o desmonte de um mecanismo de subsídios que está fazendo a conta de energia explodir.
Existem várias questões preocupantes. Por exemplo, a [usina nuclear] Angra 3 vai entrar no sistema como reserva de capacidade? Isso representaria mais de R$ 4 bilhões [US$ 770 milhões] de custos adicionais por ano para os consumidores.
Outro caso: as transmissoras querem substituir equipamentos antigos por novos precificados pelo banco de preços da Aneel. Isso pode adicionar mais R$ 32 bilhões nos custos de transmissão.
O consumidor brasileiro pagou pelos “jabutis” da privatização da Eletrobras, pelos subsídios ao carvão, pequenas distribuidoras e geração distribuída.
Locca: Amanhã [quinta-feira], os consumidores brasileiros pagarão R$ 1,3 bilhão pelas termelétricas contratadas no leilão de emergência [PCS, realizado em 2021], sendo que quase R$ 450 milhões são para plantas que entraram em operação com até quatro ou cinco meses de atraso. E só estão recebendo porque a Aneel, até agora, não finalizou a avaliação dos pedidos de excludente e outros processos administrativos. Só falta isso para rescindir os contratos.
O ano de 2023 começa com reajustes nas tarifas de energia elétrica muito próximos da inflação, e algumas distribuidoras terão até reduções tarifárias. Portanto, esta pode ser uma oportunidade de rediscutir o setor sem um ambiente de estresse. Rediscutir a formação de preços e a CDE [Conta de Desenvolvimento Energético], para que possamos transferir subsídios dentro da CDE para o orçamento da União, que deve arcar com esse custo.
Um dos maiores impactos nos últimos anos é a CCC [Conta de Consumo de Combustível, que subsidia os custos anuais de geração de áreas não conectadas à rede nacional], que teve uma elevação enorme em função do aumento dos preços dos combustíveis. Esses subsídios giram em torno de R$ 10 bilhões por ano.
Em paralelo, o subsídio para fontes renováveis, fontes incentivadas, pela CDE vem aumentando em ritmo acelerado, chegando a R$ 9 bilhões anuais.
Além disso, há a tarifa social, que, nos últimos dois anos, mais que dobrou devido à pandemia de Covid-19. E vai continuar crescendo. A Abrace reconhece que, socialmente, é justo haver tarifas diferenciadas, mas isso é uma política pública, não do setor elétrico. Teria que ser suportada pelo governo federal.
BNamericas: Como a Abrace enxerga o cenário de abertura do mercado de energia?
Pedrosa: Somos a favor da liberdade de escolha. Mas é importante dizer que o mercado de energia no Brasil tem muitas distorções e subsídios. A abertura do mercado com a manutenção dos subsídios vai atender parcialmente a alguns consumidores, mas vai gerar uma explosão dos encargos da CDE que serão pagos pelos demais consumidores. A abertura precisa servir à eficiência do mercado, beneficiando a todos no mercado, não apenas a alguns consumidores.
BNamericas: Quais são os principais pleitos da associação atualmente e as pautas para 2023?
Pedrosa: No setor de gás, é importante que se cumpra o que foi aprovado na Lei do Gás. Alguns estados estão aprovando leis que contradizem essa legislação. Temos muito gás do pré-sal, mas corremos o risco de perder a oportunidade da transição energética com esse combustível.
Lorenzon: A ANP ainda não estabeleceu nenhum regulamento previsto pela Lei do Gás. E, onde o governo federal não entra, os estados acabam criando regras que beneficiam as distribuidoras [que são estaduais] e tolhendo o nascimento e desenvolvimento do mercado livre, mantendo a demanda via mercado cativo.
Outra agenda importante é a concentração da oferta de gás nas mãos da Petrobras. A ANP deve abrir uma consulta pública a respeito desse tema. Nos preocupa a possibilidade de o Cade revisitar o TCC com a Petrobras. Lutaremos contra isso.
Locca: É preciso rediscutir a obrigatoriedade de contratação dos 8 GW de térmicas a gás [prevista na lei de privatizações da Eletrobras]. Defendemos que essa contratação não ocorra, pois o país não tem essa necessidade. Quando todas estiverem em operação, custarão aos consumidores pelo menos R$ 20 bilhões por ano.
BNamericas: O hidrogênio verde está nos planos de seus associados?
Pedrosa: Temos muito interesse. No setor siderúrgico, por exemplo, o hidrogênio verde pode potencializar o papel do Brasil na exportação de aço, com o aço verde. Mas temos uma preocupação: que o desenvolvimento do hidrogênio verde não se dê com base em subsídios do setor elétrico.
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