Raio-x: o envolvimento da China no setor de energia chileno

A China está constantemente expandindo sua presença no setor elétrico do Chile – uma tendência que provavelmente continuará.

Com apoio bipartidário para energias renováveis, metas de descarbonização e abertura a investidores estrangeiros, o Chile provou ser um alvo para a potência asiática. A China também é o maior parceiro comercial do Chile.

Globalmente na América Latina, a China vem adotando uma abordagem cada vez mais estratégica, com foco em aumentar sua presença em setores de crescimento, incluindo energia e tecnologia.

O ano de 2016 constitui um marco na esfera de investimentos energéticos Chile-China. A State Power Investment Corporation adquiriu os ativos globais – incluindo aqueles no Chile – da desenvolvedora australiana de energia limpa Pacific Hydro por cerca de US$ 3,00 bilhões, o que também abriu as portas para a provisão de financiamento de projetos.

Em outra incursão naquele ano, a fabricante de painéis solares Trina Solar, presente no Chile desde 2013, e a desenvolvedora espanhola Grenergy Renovables anunciaram um acordo de parceria de projeto com foco no Chile.

“Desde então, as fusões e aquisições, os projetos greenfield e o fornecimento de equipamentos só se intensificaram”, disse Ignacio Tornero, CEO-fundador da empresa de consultoria jurídica e empresarial East Consulting, com sede em Santiago, à BNamericas.

“Nos próximos anos, esperamos que as empresas chinesas continuem participando ativamente do mercado de eletricidade chileno, sobretudo por meio de leilões e desenvolvimentos greenfield, bem como fornecimento de equipamentos tecnológicos.”

A JinkoSolar é outro fabricante de painéis na onda chilena, alimentado por uma meta de energia limpa determinada pelo governo que já foi superada e está em processo de atualização. Diante desse cenário, em um leilão de fornecimento de energia em 2022, a Zapaleri, uma unidade local da Canadian Solar liderada pela China-Norte-Americana, ganhou um contrato para o projeto de armazenamento fotovoltaico solar de 253 MWp Zaldivar.

A China, e mais especificamente as empresas estatais, gastou bilhões de dólares para obter ativos de rede no Chile, um país que adota uma postura relativamente pragmática e neutra em termos de parceiros de investimento. Em 2018, a China Southern Power Grid International pagou US$ 1,3 bilhão por 28% da empresa de transmissão Transelec, enquanto um ano depois, a State Grid Corporation of China entregou US$ 2,23 bilhões pela distribuidora Chilquinta Energía. Então, em 2020, a State Grid adquiriu a distribuidora CGE por US$ 3 bilhões.

Cumprindo a regulamentação antitruste no Chile, o procurador nacional econômico FNE realizou uma análise dos movimentos de fusões e aquisições chinesas. A conclusão nas aquisições analisadas, disse Tornero, foi que todas as empresas pertencentes e sob a supervisão da Comissão Estatal de Supervisão e Administração de Ativos do Conselho de Estado (SASAC) são consideradas relacionadas, de acordo com a lei chilena.

As empresas chinesas, entre outras manobras de geração e rede, também obtiveram ativos de geração distribuída, de acordo com dados da empresa de pesquisa TTR, com sede na Espanha. O comprador, disse a TTR em um relatório compilado para a BNamericas, foi a Sungrow Power Chile, uma unidade local da empresa de tecnologia de transição de energia Sungrow Power Supply.

Em outra transação, a desenvolvedora China International Water & Electric Corporation adquiriu em 2017 a empresa brasileira de energia renovável Atiaia Energia, cujo portfólio incluía o projeto hidrelétrico a fio d'água chileno Rucalhue, de 90MW, que tem uma licença ambiental, mas está paralisado em meio à oposição local sobre seu impacto potencial.

Paralelamente, a China vem consolidando seu papel como fornecedora de componentes. Entre os últimos negócios, o fabricante de turbinas eólicas Goldwind e Sungrow garantiram negócios com a geradora Engie Energía Chile, que comprou deles turbinas para seu parque eólico Lomas de Taltal de 342 MW e baterias com capacidade associada de 638 MWh para seu parque solar Coya de 180 MW.

A Goldwind, anteriormente estatal, trabalhou com os desenvolvedores Enel Green Power e Mainstream Renewable Power, disse Tornero (foto), que também é professor afiliado do Centro de Estudos Internacionais da Universidad Católica e membro de seu Centro de Estudos Asiáticos.

Tornero destacou que a Transelec e a Southern Power Grid, juntamente com a colombiana ISA, fazem parte do consórcio Yallique, que recebeu a concessão de um contrato para construir e operar uma linha HVDC de 1.500 km – Kimal-Lo Aguirre – vital para descongestionar o despacho de energia do ensolarado norte do Chile.

Entre outras iniciativas no espaço de construção local, a China, por meio da empresa EPC PowerChina Chile, também está envolvida nos projetos de backup a diesel e energia solar de 200 MW Cala Morritos e 480MW CEME1, respectivamente.

Em outro lugar no mapa mais amplo de energia elétrica, os fabricantes chineses de ônibus elétricos Foton e BYD têm uma posição no Chile e a última empresa disse recentemente à BNamericas que também estava de olho em oportunidades nos veículos elétricos de passageiros, cátodo de lítio e espaços de armazenamento de energia. A BYD, com as marcas chinesas Higer, Maxus, MG e Voltera, já está presente no segmento local de veículos leves elétricos, que deverá acelerar à medida que os preços, intimamente associados aos custos da bateria, caírem.

Nos segmentos de armazenamento de energia e painéis solares em particular, o primeiro deve crescer rapidamente após a aprovação de um projeto de lei associado no ano passado que abre as portas para unidades autônomas – empresas que podem oferecer agilidade do lado da oferta e preços atraentes têm uma vantagem competitiva, algo que a nascente indústria de hidrogênio verde do Chile provavelmente também procurará.

Com os músculos de produção de eletrolisadores existentes – a China responde por cerca de um terço da capacidade de produção global, de acordo com o instituto de pesquisa europeu Merics – e conhecida capacidade de aumentar rapidamente a produção, a China parece bem posicionada para enfrentar a onda inicial nesta década.